As férias já terminaram há algum tempo, mas o corrupio laboral – e vá, uma net muuuuito lenta no trabalho – impedia-me de fazer a rentrée de “Coreia do Norte: um Segredo de Estado”. Voltei, portanto.
O burburinho dá-se agora à volta da sucessão. Mais um Kim, já se sabe. Kim Jung-un, 27 anos. O filho mais novo de Kim Jong-il, neto de Kim Il-sung.
Kim Jung-eun já terá sido designado pelo Partidos dos Trabalhadores como o sucessor de Kim Jong-il. Falta agora uma reunião extraordinária para preparar todo o processo de sucessão.
Mas atenção!, há uma mulher que pode estar na corrida ao trono. Como Kim Jong-eun é muito novo, fala-se que a irmã do “Querido Líder”, Kim Kyung-hee, é uma forte candidata já que é uma das pessoas em quem Kim Jong-il mais confia.
Quando Kim Il-sung morreu, em 1994, há muito que o filho, Kim Jong-il, o acompanhava e já aparecia nos retratos de Estado. Mas de Kim Jung-eun (ou mesmo de Kim Kyung-hee) pouco se sabe, pouco se viu e pouco se deseja.
No Washington Post lê-se que os norte-coreanos não estão muito virados para esta sucessão (como já não estavam para Kim Jong-il).
Das opiniões que tenho recolhido, em entrevistas ou leituras, há a opinião comum de que Kim Il-sung era o “salvador” da Coreia do Norte e que a situação começou a piorar a partir da sua morte, muito graças ao filho.
Na verdade, o retrato da fome (e muito mais o da opressão) já se desenhava antes de 1994, mas foi nos anos seguintes que se acumularam as más práticas do passado, dando a sensação de haver apenas um culpado pelo falhanço do regime.
Entretanto, Jimmy Carter foi buscar mais um norte-americano à Coreia do Norte. Desta vez, quem se safou foi o professor activista Aijalon Mahli Gomes.
Gomes e Carter saíram e, pouco depois, chegava a equipa feminina de futebol da cidade britânica de Middlesbrough. É a primeira vez que uma equipa de futebol britânica visita a Coreia do Norte.
E para recomeço da conversa é só! Cheira-me que os próximos tempos vão ser animados!
Apesar de a imagem da família estar omnipresente em gravuras, estátuas, etc. tenho uma certa curiosidade em saber se a influência do cargo de chefe do Partido é tão absoluta nas tomadas de decisão. Por exemplo, li quem esteve em Cuba e afirma que existe bastante debate político, p.ex. assembleias populares e que, apesar da influência dos Castro (artigo diário no jornal propriedade do Estado), é normal haver conversas de café sobre que medidas tomar, etc. Os media, no entanto, centram-se na imagem no ditador. Do pouco que viu, a Rita acha que a Coreia do Norte é um verdadeiro “quero posso e mando” por parte do trono, ou acha que existe alguma autonomia nas decisões de um dado ministério, ou quando se decide o orçamento, etc? (Será que os 687 deputados que existem na assembleia fazem algum trabalho de casa ou limitam-se a seguir directivas?)
(Este comentário serve apenas e só para levantar o véu relativamente a uma questão importante: no Ocidente temos a certeza absoluta que a nossa democracia tem um nível bastante profundo, no entanto que imagem teria a imprensa soviética construído, relativamente aos EUA, ao bombardear os seus cidadãos com a imagem do seu presidente?)
Sou brasileira, estudante de Relações Internacionais e desde que descobri esse blog, me encantei, enfim, alguém se interessa pela Coréia do Norte…Vou começar minha monografia, não sei se é assim que vocês chamam o trabalho de conclusão do curso aí em Portugal, mas estou decidida a escrever sobre a Coréia do Norte e encontrei aqui uma fonte de conhecimento e discussão…aguardo pelos próximos posts ansiosamente porque também estou curiosa pra saber sobre a sucessão do trono de Kim Jong-il.
Caro(a) AAA,
Sim, na Coreia do Norte é um verdadeiro quero, posso e mando. Maioritariamente pelo Querido Lider, mas também por alguma elite do partido, o Inner Circle.
Também há representantes populares. A estrutura política da Coreia é altamente hierarquizada, mas estes não mandam efectivamente nada.
Conversas de café, em teoria pode haver, mas ninguém contesta abertamente o regime.
Também há um movimento underground, de pessoas que arriscam a sua vida e a vida de quem lhes são próximos.
Nota final: “no Ocidente temos a certeza absoluta que a nossa democracia tem um nível bastante profundo”…
esta era para rir, certo?
Caro Ricardo,
Pela sua conversa, o Ricardo que sabe o que todos sabemos pelas notícias; ora esse é precisamente o tipo de informação que dispenso. É claro que a Rita viu o que lhe mostraram, e nem terá tido uma oportunidade para vaguear pelas ruas sem ser vigiada, nem sentir o espírito das pessoas, mas ainda assim gostava de saber o que pensa.
Quanto a essa nota final ser para rir, se você acha que atingimos o máximo que a democracia pode permitir, saúdo-o por poder rir com tão pouco. É claro que se pensar que só pode optar entre o nosso modelo e o da Coreia do Norte, estará a fazer um enorme favor à classe que nos governa.
Caros leitores AAA e Ricardo,
A seu tempo responderei aos vossos pertinentes e acesos comentários, mas neste momento ando em reportagem pela Suécia e Roménia, pelo que o tempo se torna escasso para uma resposta completa.
Entendo as questões de AAA – às quais irei responder – e sei que o Ricardo não fala de cor porque também já esteve na Coreia do Norte e deve ler muito sobre o assunto. Embora saibamos, Ricardo, que é impossível ter certezas quando falamos deste país, certo?
Cara Renata,
Nem imagina o prazer que sinto quando vejo que utilizam este espaço como fonte de informação. Fico feliz por saber que posso ajudar!
A todos,
Um abraço e até breve!
Rita Colaço
O AAA sem dúvida que foca uma questão muito importante: a convicção predominante (e que até fica mal questionar) que a palhaçada de sistema em que vivemos é o expoente máximo de liberdade, direitos e garantias.
É a redução ao velho “cliché” de “o melhor sistema à excepção de todos os outros” e acabou-se a conversa.
Quando as contradições desse sistema são tão profundas e tão evidentes, quando o acesso à informação e aos recursos materiais é tão desigual, penso que não existe liberdade alguma, mas apenas a ilusão disso (porque eu posso ir beber um batido ao Starbucks e um norte-coreano não pode). Uma ilusão que nos é inculcada acima de tudo através dos meios de comunicação em massa cujas decisões administrativas são tomadas de acordo com os interesses de quem os controla. Somos desinformados ao invés de informados.
É nessa medida que países como a Coreia do Norte são muito conveninentes aos poderes dominantes, já que servem para distrair as atenções das injustiças em que vivemos e apresentar outros países como os “maus da fita” e inimigos da liberdade da qual somos os maiores paladinos.
Sobre a “ditadura” na Coreia do Norte sei muito pouco ou quase nada, sobre a ditadura em que vivo, a ditadura do capital, já tenho uma ideia.
Um abraço a todos.